Há tantos
fragmentos ofuscados na masmorra da alma nesse frágil castelo da vida
encrustado no reino da existência. O primeiro tombo de bicicleta, festa de
aniversário com balões e decoração de personagens fictícios, doces, correria,
pulos, brincadeiras, os parabéns. O sanduiche na lancheira, os piques (esconde,
pega), as palmadas e os abraços caloroso e eterno dos pais. As árvores e
paisagens passando rapidamente em uma viajem na estrada, a família reunida no
almoço de domingo, aquele cachorro que dormia ao seu lado. Os pesadelos, os
jogos de futebol, as competições de natação, a hora do jantar (sem atrasos por
favor). A partida do seu colega sem volta, a timidez com as meninas, o caiu no
poço na rua do bar. As aventuras na mata, os dedos ensaguentados depois de
chutar o asfalto numa brincadeira descalço, a tacada fatal do beti. O pé de
jambo na porta de casa, o da mangueira na casa da vó, o quartinho arrumado e
organizado com as ferramentas do avô. A
horta e o galinheiro. O clube do lado de casa. As brincadeiras na chuva, o
primeiro soco na cara, o primeiro beijo seguido de um acanhado sorriso
iluminado.A hora certa de voltar para casa. O primeiro “eu te amo” amando. O
primeiro cd de rock, a primeira queda do muro ou da árvore. O aviso mortal da
diretora da escola. “Vou ligar para os seus pés”. O coração acelerado e
respiração ofegante quando a menina do olhos lindos vem para perto de ti. O
boletim com nota vermelha....O dia em que seu amigo vai embora e vc não entende
porque, e vários se vão e o porquê ainda sem solução. A adolescência longe dos
pais, destemida, pulsante e tola. O porre de vinho depois da prova. O show com
aquela galera de preto e estranha, mas estranhamente não te olha como estranho.
As longas caminhadas rasgando a capital e rompendo as suas fronteiras. A dor do
amor, o amor sem dor, e a mulher que nunca vais se esquecer. Os livros de
cabeceira, a coleção de cd´s, as responsabilidades. A busca frenética pela
auto-realização, imponência e respeito. A vez que seu amigo te deixou na mão, o
medo e insegurança do desconhecido, o frio de uma noite de junho. O dia em que
se olha no espelho e se acha hipócrita, impotente e lúgubre. E a vida vai
tecendo o seu novelo implacavelmente, pessoas vão e vão outras ficam. Algumas
dão tchau e outras tu é obrigado a dizer adeus.
As viagens rumo ao desconhecido, a natureza, e a contemplação. A
tristeza resignada no peito, e a frequência de porres com o passar da idade. A
intensidade das emoções e a frieza das atitudes. Os filmes, os signos, os autores,
as músicas que marcaram. No final das contas,
somos na verdade, chagas e alegrias que marcamos no tempo, e não o contrário,
como se parece. Somos o que devemos ser e o que queremos ser: Espíritos
Aventureiros buscando preencher o rombo que a mudança provoca toda vez que
sorrimos, choramos, lamentamos, aprendemos,
e seguimos o nosso coração cada
vez mais segmentado pela razão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário